quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

Sobre belezas

Beleza é coisa miúda e ingrata, diz mentira de eternidade e foge antes que a gente se dê conta. As mulheres que tiram o homem de seu eixo, as que produzem estragos, não são aquelas de beleza conformada em ser só isso, e sim aquelas que a primeira vista prometem menos ou mesmo nada, fazem pouco na miragem da lembrança após um primeiro encontro, mas são capazes de amadurecerem em nossa cabeça numa espécie de tacho fundo, esquivoso, um tanto escuro, bebendo a seiva do tempo. Àquelas com talento de dizerem algo – ou de rirem mais um pouco, ou rir certeiro - que sempre leva a outro além, numa máquina viciosa que tem qualquer cheiro de infinitude, de desejo de passo além; as que gestam ideias aos poucos, carregam o “ventre” lotado de colorido e um pouco de tristeza que as tornam humanas mais perfeitas em sua complacência de entenderem dores. Essas sim, carregam a beleza passo adiante e fazem rombo danoso na memória e no pensamento.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Dos perigos de se visitar um sebo - 2

Olhando os livros de história, se aproxima o vendedor.
- Olá, deseja algo?
- Olá, sim. Por favor, vocês tem um livro chamado "A Viena de Wittgenstein", do Janik?
- Um momento. Vou consultar.
Mais de cinco minutos depois volta o vendedor.
- Procurei por toda a sessão de turismo e não encontrei, senhor.
- Turismo? Não. Acho que expliquei errado. Na verdade, é um livro de historia cultural. Poderia estar, no máximo, em biografia, mas mesmo assim seria estranho.
- Ué, mas não fala sobre Viena?
- Sim, mas com o enfoque na historia cultural do período.
- Mas fala de Viena, não?
- Sim, fala.
- Ora, então é de turismo. A gente não tem mesmo.
- Ok, obrigado.
- De nada.
(Tudo na vida é relativo)

sábado, 12 de abril de 2014

quarta-feira, 26 de março de 2014

Uma paráfrase.


Nunca li nada.
Nunca lerei nada.
Tenho o direito de querer não ler nada.
À parte isso, tenho em mim todas as certezas do mundo.

segunda-feira, 29 de abril de 2013

Carta para Paulo Vanzolini

Carta para Paulo Vanzolini:

Paulo,
Você diz que morreu e nos criou um problema. Falam por aí que você morreu, mas isso não pode ser verdade. Não pode ser verdade, em primeiro lugar, porque isso não é justo. Eu lhe proíbo de morrer, em nome do Samba. Você não pode ir assim, Vanzolini. Não, você não pode morrer Vanzolini, porque, se você morresse é como se Adoniran, Geraldo Filme, Noel, Cartola, e tantos outros houvessem morrido de novo. É justo matar toda essa gente mais uma vez, me diz? Fora isso seria como se você não soubesse que o samba não morre Vanzolini, e se o samba não morre, por que você, que é este mesmo samba, haveria de morrer? Eu lhe proíbo de morrer em nome da lógica, Vanzolini.
Se você quiser uma folga, tudo bem. A gente até lhe dá um desconto, finge que não sabe que você apronta das suas. A gente finge que não sabe que você pode até dizer que foi embora, Vanzolini, mas que foi mesmo é descansar. Tirar férias dessa São Paulo que a gente nem mais reconhece. Portanto saiba: pode até o jornal da noite prestar homenagens, o jornal da manhã trazer sua foto com dizeres saudosos, Vanzolini. Pode acontecer isso tudo. Quem é do samba sabe que é mentira. É só pegar um violão pra saber que é mentira. É simples, e não adianta você jurar o contrário: que partiu pra terra dos pés juntos. Você mesmo disse que gente de sua estampa não pede juras nem faz. Pode contar a lorota de morte pra quem você quiser Vanzolini, que ela pra mim não vai colar. A gente sempre soube pelos seus sambas, que homem nenhum é tão ligeiro quanto você Vanzolini, afinal, quem ensinou para todos nós, que um homem de moral não fica no chão, que nenhum amor falido vale nem vinte e cinco cruzeiros, que pra mulher esnobe mais vale lavar as mãos que se humilhar nas suas querenças?
E não me venha chiar dizendo que é pecado essa coisa de perturbar os mortos, afinal, não foi você quem disse que os pecados de domingo quem paga é segunda feira? Você pode até dizer que eu exagero, que eu não tenho o direito de perturbar seu sono, que isso não é problema seu, que você vai mesmo e vai sem pena. Tá certo, mas não é culpa minha, Vanzolini. Você mesmo verá: eu lhe proponho, por exemplo, tomar um traguinho na São João. Tanto faz se hoje mesmo ou daqui a cinquenta anos: você verá que mesmo em outra São Paulo, Vanzolini, o seu samba não morre, que basta a gente pegar um pandeiro, um cavaquinho que você não aguenta e volta... Afinal, a São João deixará de ser a São João, mas seu samba não deixará nunca de ser o que é.
Portanto, meu caro, pode tirar o cavalinho da chuva e parar com espertezas. Pois essa noite mesmo a gente vai teimar com você. A gente vai lhe perpetuar, Vanzolini – eu e todos aqueles que amam o samba, amam São Paulo – aquela São Paulo que você conheceu e que não existe mais – todos nós vamos perpetuá-lo, vamos desenhar no tempo sua imagem feita de som e cordas de cavaquinho – pois esse é você, Vanzolini – pelas eternas madrugadas paulistanas para que todos saibam que você é forte, que você é teimoso. Portanto eu lhe convoco, mestre, hoje mesmo, sem direito à apelação. Prepare sua mão de vento, Paulo – aquela mesma que você diz na canção – e venha abraçar com a sua ventania, com sua chuva, sua São Paulo eterna.
 
Até breve,
Ronaldo

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

Dica de livro: Anna Kariênina, de Liev Tolstói




O PARTO DE UMA NOVA RÚSSIA

Se levarmos em consideração a ideia de mal estar na sociedade, proposta por Freud e a conclusão de que o homem moderno trocara um quinhão de sua liberdade para possuir um quinhão de segurança e, se cotejarmos essa afirmação com a ideia do sociólogo Zigmunt Bauman de que houve, na pós-modernidade, uma inversão deste fluxo – hoje trocamos nosso quinhão de segurança por um de liberdade – talvez possamos enxergar em Anna Karienina a primeira personagem feminina a apontar as direções da angústia no vindouro mundo pós-moderno.
Escrito ao início da década de 1870, Anna Kariênina é um enorme painel da sociedade russa e seus conflitos políticos-ideológicos após a libertação dos servos em 1860 e as medidas progressistas adotadas pelo Czar Alexandre II. Neste sentido é um excelente contraponto estético a obra “Crime e Castigo” de Dostoievski, escrita basicamente no mesmo período e mergulhada, assim como a obra de Tolstói, nas impressões das mudanças capitais que passava a Rússia no período.  Poderíamos dizer – aqui utilizando o termo no sentido que dá George Steiner em “Tolstói ou Dostoievski?” – que enquanto Crime e Castigo oferece a visão perturbada e dionisíaca daquela época, a obra de Tolstói seria o entendimento clássico, apolíneo do momento.
São várias então, as maneiras que podemos compreender a obra: podendo ser lida não somente como a angústia do indivíduo - especialmente a de Anna Kariênina  sem esquecer, no entanto das provações dos personagens de Kariênin, Oblonski, Kitty, Liévin – a obra pode ser vista como a agonia de uma era e de um povo: Na obra , a decadência da aristocracia russa é demarcada com primor, bem como o aparecimento das discussões de cunho socialista, aqui focados no personagem de Liévin e sua angústia de entender o momento e tentar apontar soluções. A questão religiosa perpassa também grande parte dos personagens, e a busca pelo sentimento religioso verdadeiro é parte das expiações pelos quais atravessam. Aqui vale a pena salientar que a questão de cunho religioso é fundamental para uma melhor compreensão da obra. Se entendermos a personagem título não somente uma mulher em busca de um prazer extraconjugal mas também um indivíduo em uma busca desesperada pela verdade; podemos compreender que entre ela e a personagem de Liévin, encontram-se um contraponto fundamental na construção da obra. Anna, incapaz de viver diante da constatação do Absurdo – aqui no sentido estritamente camusiano  - afunda na solução fácil; enquanto Liévin aceita continuar na busca, evitando cair, como o irmão Nikolai, na revolta (igualmente camusiana). 
Obra fundamental da literatura Russa, Anna Kariênina  é a imagem perfeita do país rompendo em ânsias de modernidade, e que vê na expiação da personagem título sua perfeita representação.  

terça-feira, 19 de junho de 2012

Para fazer um poema dadaísta V.2.0
Ou
Homenagem a Tristan Tzara

Ligue o computador.
Entre no google translator.
Escolha um poema já existente do tamanho que você deseja dar ao seu poema.
Copie e cole o poema.
Verta o poema para outras línguas
Diversas vezes.
Depois traduza-o novamente para o português.
O poema se parecerá com frases malucas com um leve gosto de parachoque de caminhão.
Ei-lo um escritor infinitamente original e de uma sensibilidade graciosa, ainda que incompreendido pelo amigo do face.